Mamãe Noel segura o choro com pedidos comoventes de crianças: ‘Muitas só querem comida’ em Ribeirão Preto, SP

Mamãe Noel se emociona com pedidos por comida e solidariedade no Natal em Ribeirão Preto, SP. Cartinhas são lidas diariamente, revelando histórias emocionantes.

Mamãe Noel diz que precisa segurar o choro com pedidos de crianças: ‘Muitas só querem comida’

Ivani Pereira dos Santos, de 57 anos, não esconde a emoção ao falar do personagem que interpreta no Natal e diz que o sentimento de solidariedade deveria durar o ano inteiro: ‘Poderia ter empatia pra sempre’.

Papai Noel e Mamãe Noel leem todas as cartinhas que chegam em Ribeirão Preto, SP

DE leem todas as cartinhas que chegam em Ribeirão Preto, SP

O Natal sempre foi especial para a aposentada Ivani Pereira dos Santos, mas há oito anos, ela vivencia a data de maneira ainda mais marcante. É que ela dá vida à Mamãe Noel e acaba ouvindo de crianças e adultos os pedidos mais emocionantes.

> “Muitas das cartinhas que a gente recebe nem são de pedidos de brinquedo. Claro, sempre há esse tipo de pedido, mas o que me marca é uma criança deixar escrito no papel que a família precisa de comida e isso acontece bastante. Muitas só querem comida”.

Na Casa do Papai Noel, localizada no Centro de Ribeirão Preto (SP), DE e o Papai Noel, José Franklin Winston Teixeira de Andrade, de 79 anos, costumam receber cerca de 30 cartas por dia. Todas elas são lidas e separadas, porque muitas pessoas procuram o local em busca de pedidos que possam ser realizados.

> “Tem pessoas que passam aqui para pegar as cartinhas, que vem e querem dar uma olhada nas cartinhas para ajudar. A gente já deixa separado algumas cartinhas que a gente vê que há possibilidade, porque tem criança também que escreve muita coisa, ‘eu quero um bebê reborn’, eu quero isso, muitas coisas juntas. E aí a gente separa as cartas que vê que há possibilidade de alguém dar esse presente”, diz Ivani.

Em oito anos trabalhando como Mamãe Noel, a aposentada conta que não foram poucos os momentos em que teve de segurar o choro por conta de algum pedido.

A aposentada Ivani Pereira dos Santos, de 57 anos, dá vida à Mamãe Noel em Ribeirão Preto, SP — Foto: Flávia Santucci/g1

Mas uma história específica a marcou de maneira especial: a de uma mulher que sentava com os filhos na praça que fica bem em frente ao imóvel, esperando pelos amendoins que eram distribuídos para quem passava por ali.

> “A gente estava dando amendoins, balas. A gente sempre dá, todo ano. E ela veio um dia com as crianças. Veio no dia seguinte e no outro. Aí fui conversar com ela e ela me contou que eles estavam com fome. Fazia quatro dias que a refeição do dia inteiro da família era só os amendoins que a gente distribuía”.

Na terça-feira (17), quando a reportagem do DE esteve no local, Ivani tinha acabado de receber uma cartinha onde uma menina de 10 anos pedia por alimentos para a noite de Natal.

“Eu me emociono demais, porque queria ajudar todos. Mas fico feliz que muita gente ajuda também. Você vê que nesta época do ano, as pessoas têm mais empatia. Durante o ano não, mas perto do Natal, você vê que acontece. Você olha para a praça, vê logo de manhã o pessoal dando café da manhã, olha à tarde, tem pessoal dando almoço. E eles [as pessoas carentes] vêm, porque sabem que naquele dia vão ter. Poderia ser muito mais vezes. Poderia ser sempre”.

Carta recebida pela Mamãe Noel em Ribeirão Preto, SP, pede comida de Natal — Foto: Flávia Santucci/g1

O processo de ler cada carta, diz Ivani, começa antes mesmo da abertura das portas na Casa do Papai Noel. É nesta hora que os pedidos mais ‘plausíveis’ são separados para os interessados em ajudar.

“Assim que a gente chega, a gente faz a leitura de todas e aí já separa as que têm endereço, porque a maior parte também não vem com o endereço. As cartas que não têm endereço vão ficando armazenadas. Já aconteceu de a criança vir duas vezes e a gente percebe que tem uma carta com o endereço e outra sem. De repente, ela percebeu que estava sem endereço e voltou deixar outra”.

Tradição de escrever cartinhas ao Papai Noel tem mais de 200 anos e, provavelmente, começou na Alemanha — Foto: Flávia Santucci/g1

No meio de tantos pedidos, a Mamãe Noel diz que nada passa despercebido. Mesmo se o papel vem com apenas um desenho ou uma frase impactante como o desejo de ‘não voltar pra casa’ ou de ‘a mãe ser feliz’.

“Já teve caso de pedir para não voltar para casa ou pedir para que ‘minha mãe seja feliz’. Então a gente vê que são algumas coisas que a criança deve viver em casa e aí, na hora de fazer o pedido do Papai Noel, pensa nisso. Vem do coração deles. E pra gente que está aqui, receber e ler essas cartinhas é muito emocionante e, ao mesmo tempo, triste”.

Hoje, o Natal da Mamãe Noel é diferente de quando ela era criança. Por ter nascido em uma família evangélica, Ivani diz que não costumava comemorar a data e a tradição cristã não fazia parte do lar em que ela cresceu.

A magia do Natal, no entanto, ela garante que sempre esteve presente.

“Eu tinha uns 12 anos quando, um dia, pedi pro meu pai ‘vamos fazer uma ceia’. Ele falou que não e disse ‘você pode fazer uma ceia pra você’. E eu comprei um monte de coisa, sentei à mesa e fiz uma ceia para mim. Fiz uma ceia para mim, sozinha”.

Para Ivani, ter a oportunidade de trabalhar como Mamãe Noel, mesmo que durante um curto período no ano, a faz renovar as crenças nas pessoas e acreditar em um mundo melhor.

“Natal para mim é o nascimento de Jesus e é por isso que eu acho que é essa magia. Meu desejo é que ele nasça todos os dias nos corações e que essa magia, isso que as pessoas sentem, seja o ano inteiro. Acredito que as pessoas têm essa dificuldade de todos os dias sentir essa alegria, esse amor, olhar para outra pessoa e ter aquela empatia de ‘o que a gente pode fazer’. Podia ser diferente”.